Este espaço é desaconselhável a menores de 21 anos,
porque a história de nossos políticos
pode causar deficiência moral irreversível.

É a vida de quengas disfarçadas de homens públicos; oportunistas que se aproveitam de tudo e roubam sem punição. Uma gente miúda com pose de autoridade respeitável, que engana o povo e dele debocha; vende a consciência e o respeito por si próprios em troca de dinheiro sujo. A maioria só não vende o corpo porque este, além de apodrecido, tem mais de trinta anos... não de idade, mas de vida pública.


segunda-feira, 17 de junho de 2013

GUERRA OU PAZ? - Artigo de AUGUSTO FRANCO

AUGUSTO DE FRANCO - (16/06/2013)

Sobre as tentações militantes que acossam alguns participantes
das manifestações de rua em São Paulo e alhures

GUERRA OU PAZ?
Publicado por Augusto de Franco em 17 junho 2013 às 9:34 em A TERCEIRA INVENÇÃO DA DEMOCRACIA - Back to A TERCEIRA INVENÇÃO DA DEMOCRACIA Discussions 
Participei de muitas manifestações de rua. A mais famosa ficou conhecida como "Passeata dos 100 mil". Não eram assim tão espontâneas, nem convocadas peer-to-peer como algumas que, felizmente, vemos hoje. Eram articuladas centralizadamente ou descentralizadamente (quer dizer, multicentralizadamente), não distribuidamente (e se alguém ainda não entende essa diferença - entre descentralizado e distribuído - não poderá entender quase nada do que vou dizer aqui). 
“ ... Meu objetivo e os dos meus camaradas não era evitar a violência e sim provocá-la. Queríamos desmascarar a ditadura militar para desestabilizá-la. Assim, queríamos que as forças repressivas reprimissem de fato violentamente as manifestações. Não éramos suicidas e não queríamos matar ninguém, mas um cadáver produzido pela repressão seria politicamente muito bem-vindo. Um cadáver era uma bandeira preciosíssima. Então nos organizávamos para o confronto, ou para desencadear o confronto. Íamos armados de vários objetos, desde coquetéis molotov, bombas caseiras, bolinhas de gude e rolhas (para derrubar os cavalos), forquilhas de pregos soldados para furar pneus... Enfim, nos preparávamos como quem vai para a guerra. Afinal, éramos militantes (e a origem da palavra diz quase tudo). NÃO ÉRAMOS AGENTES DA PAZ E SIM DA GUERRA.
...
...  embora falássemos em democracia frequentemente, não estávamos convertidos à democracia e, na verdade, não tínhamos a menor noção do que era democracia. ÉRAMOS ANALFABETOS DEMOCRÁTICOS.
 ...
Os militantes e ativistas de hoje ...  confundem ditadura com democracia
... 
... Nós convocávamos mesmo, de modo mais centralizado do que distribuído, a massa: para arrebanhá-la, conduzi-la, instrumentalizá-la (sempre para um bom propósito, é claro), enquanto alguns de hoje (não todos, felizmente) imaginam tolamente que estão convocando, de modo descentralizado, as manifestações da multidão. ... Quanto menos eles - os militantes e ativistas adversariais - podem, mais pode a sociedade (quer dizer, a rede social). 
... grupos que se preparam para a guerra. ... bastam alguns grupos determinados a provocar a repressão policial violenta para desencadear um confronto de consequências imprevisíveis, provavelmente desastrosas.  
... Iniciada a espiral da violência, a coisa anda sozinha e corre solta. A indignação popular com a repressão policial-militar às manifestações de rua  tende ... a engrossar as manifestações. Quem não ligava para o assunto, passa também a se indignar. Milhares de novos manifestantes aderem aos protestos. Novos agentes provocadores surgem também, espontaneamente, em função da dinâmica que foi desencadeada. De 30 passam para 300, 3 mil... Se a violência continua, de parte a parte, pode-se desestabilizar até mesmo o regime político. E aí? 
Bem, aí o poder, é claro, não vai para o povo como pensam os babacas ... 
Isso não acontecerá, todavia, se multidões ocuparem as ruas. Quando centenas de milhares, milhões, saem as ruas, não há mais repressão possível. Mas multidões de pessoas conectadas - e formadas a partir de miríades de micromotivos diferentes (compondo uma grande murmuration) - não são massas arrebanhadas. ...
Uma multidão de milhões não pode ser convocada centralizadamente, nem mesmo descentralizadamente. Ela acontece por um mecanismo distribuído próprio da rede. Ela é a manifestação de uma fenomenologia da interação, um swarming (enxameamento).
...
O importante é não iniciar uma espiral de violência. O importante é construir a paz e não a guerra.
 A democracia nunca nasce da violência. ... A democracia dos modernos também não se estabeleceu a partir de nenhuma guerra, ...
 ...
As democracias não nascem de rebeliões, nem de revoluções entendidas como atos violentos de remoção dos antigos ocupantes dos cargos de poder e sua substituição por novos ocupantes.  Todos os processos que foram assim desencadeados produziram mais autocracia, não mais democracia. Estreitaram a brecha democrática que foi aberta, uma ou outra vez na antiguidade e na modernidade, na civilização patriarcal e guerreira. Restringiram em vez de ampliar as liberdades. 
As primeira medidas dos governos revolucionários que chegaram ao poder pela violência foram, via de regra, a abolição da liberdade de imprensa e da liberdade de organização, a instalação de polícias políticas e a ereção de monstruosos aparelhos estatais de repressão. Ademais, provocaram verdadeiros genocídios, os maiores de que se tem notícia na história.  
Atribui-se ao Mahatma Gandhi o dito de que não existe um caminho para a paz, a paz é o caminho. O mesmo pode ser dito da liberdade, da materialização do ideal de liberdade como autonomia e da democracia como modo pazeante de regulação de conflitos. Não existe caminho para a democracia: a democracia é o caminho.  ...
Sim, vamos ocupar todas as ruas. Amanhã, depois e quando desejarmos. Que sejamos multidões formadas por iterações de um-mais-um, não rebanhos reunidos e manipulados, massas uniformes e indiferenciadas gritando palavras de ordem fabricadas em algum covil de militantes tarados ou seguindo bandeiras de partidos autocráticos e oportunistas. Seremos milhares, centenas de milhares, milhões: mas um-a-um, pessoas únicas cada um de nós, pensando com nossas próprias cabeças, compartilhando nossos desejos de mudança horizontalmente, com nossos próprios emaranhados e recusando diretivas daqueles hierarcas ou proto-hierarcas que querem nos conduzir. 
Não à guerra. E que a paz esteja conosco!
...
Somos muitos, sim, mas um-a-um: nada de rebanho, nada de seguimento de lideranças, nada de caminhos pré-traçados para um porvir radiante, nada de revoluções épicas, nada de transformações cósmicas capazes de produzir um novo céu e uma nova terra. ... 
Nós somos os que desobedecem, no dia a dia, nos pequenos gestos, salvando os mundos em que interagimos um instante de cada vez e não em formidáveis batalhas episódicas. Nós não achamos que todo mal que nos assola será redimido quando vencermos algum grande inimigo. Sabemos que o único inimigo que existe é aquele que constrói inimigos para lutar contra eles. 
Não somos nem queremos ser heróis ou santos, que fugiram da humanidade porque não se achavam bons o bastante. Heroísmo ou santidade não convêm a seres humanos. 
Não temos mais raízes: temos antenas. Não pertencemos a grupos e não erigimos organizações, não construímos diques e não lançamos âncoras para nos proteger da correnteza, para escapar do fluxo caudaloso... Não temos medo do abismo da interação. Quando o abismo nos olha, pulamos nele. 
Nós somos as pessoas comuns.

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